segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Temos o afeto que damos



“O egoísmo é a negação da caridade. Ora, sem caridade não haverá descanso para a sociedade humana. Digo mais: não haverá segurança. Com o egoísmo e orgulho, que andam de mãos dadas, a vida será sempre uma carreira em que vencerá o mais esperto, uma luta de interesses”

A necessidade essencial do ser humano é a afetividade – fonte de vida e equilíbrio, saúde e sanidade. Sem ela a criatura se estorcega na dor da carência emocional.

O mundo em que vivemos, em ambas esferas de movimentação, tem sido palco das mais lamentáveis “tragédias de amor”... Qual seria em síntese a causa das grandes lutas atuais nos relacionamentos afetivos? Que estaria pro traz das amargas desilusões daquelas “promessas encantadas”, nos consórcios felizes dos primeiros encontros entre dois corações?

Sem refletirmos sobre o egoísmo não conseguiremos entender com clareza a natureza das provas do coração, nas quais se envolvem esmagadoras percentagens da humanidade terrena.

Um dos mais punitivos resultados da personalidade egoísta que tecemos, em milênios de desvarios, é o hábito de exigir da vida o que a ela não damos, lesando a nós próprios com os efeitos infelizes das cobranças e expectativas absurdas.

O egoísmo pelo qual optamos na fieira evolutiva nos consome com pesados tributos. Em razão disso, perante as mágoas não temos força para perdoar. Por sua causa não sabemos conviver pacificamente com os desapontamentos e a frustração e, ainda, através de sua sanha perturbadora, somos constrangidos a lamentáveis dependências nas relações afetivas para aquisição do que acreditamos ser segurança e realização.

Devido às mágoas e às contrariedades do caminho, o egoísmo pode singrar a alma com a irritação e o desânimo. Devido às dependências, o egoísmo pode conduzir-nos ao despenhadeiro da tormenta mental e da devassidão.

Alguns casais conseguirão passar uma existência inteira como escravos do processo de exigência do amor um do outro, habituam-se a dar o que um cobra do outro e avançam para uma união sustentável, conquanto pouco educativa e extremamente simbiótica, não permitindo a autonomia que enobrece e liberta.

Nas entranhas desses relacionamentos, com raríssimas exceções, constata-se a nociva tendência de cultivar elevadas expectativas com os que nos cercam nas vivências afetivas. Espera-se sempre ser amado com extrema devoção e escravidão, como se isso fosse a garantia de uma relação saudável e duradoura ou, ainda, o sinônimo de fidelidade e amor. Criam-se então muitas máscaras com o nome de “provas de amor”, capazes de sustentar as exigências um do outro somente pelo tempo em que durar os ESTÍMULOS DA PAIXÃO, que iludem e insuflam um “estoque temporário” nos mecanismos da afetividade. Quando um “estoque” de um dos dois exaure, se o par não dispõe de habilidades emocionais autênticas, distantes do sentimentalismo fugaz, não encontrará recursos para vencer crises e desafios naturais da caminhada, tombando nos leitos dolorosos da decepção e da ofensa, tornando-se presas fáceis das velhas armadilhas do coração – expressões sutis do egoísmo!...
Infidelidade e separações, desencanto e fuga originam-se da incapacidade humana de gerir seus sentimentos em direção ao fenômeno psíquico e emocional da desvinculação. Raramente escapam os cônjuges dessa amarga realidade da convivência amorosa. Somos herdeiros da indiferença com a qual arquivamos na subconsciência infinitos desvios da vida afetiva, e lesamos os nossos centros da sensibilidade sediados no corpo espiritual. Hoje, retomando o carreiro físico socorridos pela Luz do entendimento, somos convocados ao reajuste do nosso mundo sentimental e, para isso, teremos que aprender a carregar o “peso dos reflexos” da insegurança e da solidão, da dependência e do medo, que nada são mais do que mutações reeducativas do afeto.

O elenco das chamadas incompatibilidade, com o qual o homem procura explicar suas “alterações afetivas”, nada mais são, igualmente, que provas que a vida devolve na pessoa do outro para nossa recuperação perante a consciência. A questão da sexualidade, nesse panorama, habitualmente é vista como a causa mais provável e justa para as infelicidades da vida a dois, razão pela qual convém-nos refletir com mais profundidade no tema.

O prazer sexual é ago inerente à caminhada espiritual humana, constituindo uma necessidade bio-psíquica do ser. Graças aos aleives cometidos no ontem, poucas vezes vamos escapar dos tormentos nessa área com aqueles que assumimos os compromissos de uma vida afetiva. Por esse motivo, o casal que queira vencer as aferições essenciais nessa prova deverá aprender a suprir, com companheirismo e trabalho edificante, os sopros indesejáveis da traição ou desistência que são desferidos pela mente, quando em desalinho.

Justificar uniões interrompidas em razão de tais desacertos ainda é flagrante expressão de egoísmo dominante. Muitos relacionamentos que usufruem ricos prazeres corporais de sexualidade, se não constroem carinho e interesse VERDADEIRAMENTE ALTRUÍSTA (O VERDADEIRO, VIU), também sofrerão, a seu turno, os lances da incompatibilidade por outras razões. Satisfação sexual, por si só, não é garantia de saúde nos empreendimentos afetivos.

Observa-se, mesmo entre aqueles que foram iluminados pela Sabedoria, o abandono fragoso perante paixões que irrompem repentinas nos velhos testes do “triângulo amoroso”. Nesses quadros, freqüentemente constata-se que muitos companheiros analisam suas provas exclusivamente sob o enfoque da carência sexual, em razão das limitações que um dos dois apresenta para respostas satisfatórias e estimulantes. São as “provas afetivas”, cujo cerne é do desafio de transformar as decepções em relações de respeito e legítima fraternidade, no triunfo sobre o narcisismo que nos consome há tempos.

Entretanto, poucos são os que se dispõem ao triunfo ante tais aferições da vida. A “filosofia descartável” atingiu inclusive as relações. Estamos desistindo muito facilmente uns dos outros. Seja o motivo que for, estamos desistindo.

Mecanismos mentais, parcialmente conhecidos pelas ciências psicológicas desse planeta, são capazes de criar “ilusões perfeitas”, com as quais corações desatentos permitem-se continuar prisioneiros do ego, quando em verdade, são chamados ao testemunho da liberdade, da caridade para com o outro. Casos existem nesse setor em que a criatura é capaz de arquitetar “inconscientemente” uma traição do outro, para que possa encontrar um álibi consciencial para sua traição – sutil processo de fuga com tentativa de se absolver.

Ante de recriar as relações só pode fazer parte da vida de quem descobriu que o afeto se tem é somente aquele que se dá.

A grande meta dos investimentos afetivos é o desenvolvimento da amorosidade, ou seja, as atitudes que decorrem da alegria e do entusiasmo em fazer a felicidade de quem está ao nosso lado, esquecendo, se necessário for, das nossas expectativas.

O desejo em ver o outro feliz é a alma dos relacionamentos duráveis e educativos. A alegria com o bem-estar alheio é o “cravo da morte” no egoísmo infelicitador. O carinho e a ternura, o gosto de servir e o diálogo com lídimo ato de diversão são alguns medidores do afeto verdadeiro, quando vicejam espontaneamente entre os pares.

Só temos o amor que damos, porque experimentamos no corpo e na alma as benesses de seu quimismo. O amor que esperamos, embora justo, quase sempre termina na loucura e tédio, decepção e cobrança.

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